01/11/2011
Para arcebispo, sentença que o condenou
é "inválida"
Religioso diz que apontará as
"mazelas do Judiciário"
A Arquidiocese de Porto Alegre divulgou
em seu site nota sobre entrevista coletiva realizada nesta segunda-feira
(31/10), em que o arcebispo Dom Dadeus Grings lançou a carta intitulada
“Judiciário invade jurisdição da Igreja”. Na carta, o religioso faz críticas ao
Judiciário por conta de uma ação de danos morais em que foi condenado,
juntamente com Diocese de São João da Boa Vista, a pagar R$ 940 mil.
Segundo a nota, o processo decorre da
década de 90, quando Dom Dadeus, atendendo ao pedido da população de Mogi Guaçu
(SP), posicionou-se a favor de uma obra da prefeitura local. O entrave era um
terreno. A família envolvida ingressou na justiça, sentindo-se prejudicada e
pedindo indenização em valor “dez vezes acima do normal”. A aquidiocese informa
que a ação já transita em julgado e definiu o valor citado a ser pago por Dom
Dadeus e pela Diocese de São João da Boa Vista.
Dom Dadeus classificou a decisão como
“agressão”, “arbitrária” e “impraticável”. O Arcebispo de Porto Alegre afirmou
não ter recursos para pagar a soma definida pela justiça, ao mesmo tempo em que
parafraseou São Gregório VII para definir sua postura diante do ocorrido:
“Porque amei a justiça e odiei a corrupção, fui condenado pelo judiciário
brasileiro”.
Leia a carta na íntegra :
JUDICIÁRIO INVADE JURISDIÇÃO DA IGREJA
JUDICIÁRIO INVADE JURISDIÇÃO DA IGREJA
Dom Dadeus Grings, Arcebispo de Porto
Alegre
Chegou ao fim mais um capítulo da
agressão do Judiciário contra a Igreja Católica. Após 16 anos de tramitação, o
Tribunal de Justiça de São Paulo condenou-me, juntamente com a Diocese de S.
João da Boa Vista, onde fui Bispo de 1991 a 2000, a pagar uma indenização, por
danos morais, no montante de R$ 940.000,00, reforçando o que se chama de
“indústria das indenizações”, com bases totalmente arbitrárias e impraticáveis.
Volta à mente a questão dos precatórios! Que cidadãos recorram ao Judiciário
para dirimir suas questões é de direito, mas que o Judiciário não distinga o
certo e do errado, a verdade da falsidade, não tenha critérios objetivos para
julgar e, principalmente, não reconheça os limites de sua jurisdição nem siga
os Acordos internacionais, põe toda a sociedade em risco. O problema da
corrupção no Brasil tem sua base exatamente ali, no Judiciário. Todos sabem
disso, nas poucos têm coragem de denunciá-lo! Nossa Presidente começou a faxina
no Executivo. Quando será a vez do Judiciário, onde o problema é muito mais
grave?
Eis o fato: Na década de 90, no
Município de Mogi Guaçu, SP, concluiu-se um clamoroso processo judiciário que,
por razões que chamei de falta de lisura, demorou mais de 10 anos. Sob ameaça
de intervenção, foi decretada uma indenização milionária, dez vezes acima do
real. Diante da calamidade pública, alguns cidadãos recorreram a mim, como
Bispo da região. – Lembre-se o provérbio que, diante de problemas insolúveis,
se manda queixar-se ao Bispo - Trouxeram-me o volumoso processo, que li
estarrecido. Escrevi, em consequência, diversos artigos, fazendo ponderações em
defesa do Município. Não agi em causa própria. Em reconhecimento o Município
outorgou-me, solenemente, o título de Cidadão. A sociedade aplaudiu minha
intervenção. A família envolvida, porém, me entregou pessoalmente, na Igreja da
Imaculada, uma carta, declarando-se atingida, mesmo que não a tivesse nomeado.
Respondi, em carta particular, reconhecendo ser justo reivindicar o que de
direito, mas não dez vezes mais. Tinha em mãos o relatório das dificuldades das
negociações. Adverti que seus advogados, com suas invectivas, “não me deixavam
a impressão de lisura”. Por esta expressão, nesta carta não publicada, sou
condenado a pagar R$ 940.000,00, a título de danos morais. É justo?
Era obrigação minha, de pastor,
orientar a referida família e chamar a atenção aos desvios. Ela, pelos vistos,
passou a carta aos seus advogados que, a partir de então, começaram a me
atacar, tanto por jornais como pelo rádio e televisão, culminando num duplo
processo. Chegaram a afirmar que eu poderia ser condenado de dois a três anos
de prisão, provocando celeuma entre a população, que, em conseqüência, promoveu
um ato público de desagravo em meu favor.. Tive, por isso, que esclarecer a
opinião pública.
O judiciário, em nenhum momento,
examinou a lisura dos advogados, para ver se a impressão que eu tivera era
correta. O judiciário nunca procurou investigar acerca dos ataques que os
advogados dirigiram contra mim e as calúnias que proferiram. Se sofreram “danos
morais”, foi pelas agressões e pelo processo que eles promoveram contra ao
Bispo e a Diocese. Desde o início, o Judiciário se mostrou parcial, em defesa
de “sua gente”.
O montante da indenização ultrapassa
qualquer bom senso. Vê-se que os Juizes estão desligados da realidade. Os
ministros da Igreja católica não recebem salários polpudos, como eles, nem
amealham fortunas.
O que, porém, leva a dizer um redondo e
sonoro não à sentença condenatória e dar um basta aos desmandos do Judiciário é
sua invasão no campo da jurisdição da Igreja. O Judiciário não reconhece seus
limites. Em primeiro lugar, os juizes bem sabiam que os querelantes buscavam
lucro fácil. Alexandre Jobim classifica a indústria da indenização como
“artimanha de algumas pessoas para ganhar dinheiro” E por incrível que pareça,
obtêm, com facilidade, o aval do Judiciário. Arrolaram a Diocese para garantir
o dinheiro, com o objetivo de arrancá-lo do povo católico. Com isto
reconheceram, publicamente, que estavam invadindo a missão específica da Igreja
e não de um cidadão particular. O Judiciário se joga, pois, diretamente contra
a Igreja. Contraria frontalmente sua missão profética de se pronunciar sobre
questões de ordem social e moral.. Na verdade o Judiciário quer silenciar a Voz
da Igreja frente ao bem comum, como tenta com a imprensa, para acobertar a
corrupção no país.
Em segundo lugar, os juizes
acintosamente não respeitaram o Acordo entre a Santa Sé e o Brasil, assinado
solenemente em Roma, no dia 13 de novembro de 2008, já ratificado pelo
Congresso nacional. Trata-se de um acordo internacional, de respeito mútuo das
competências. Não pode ser desrespeitado impunemente.
Não posso, por coerência e dever de
consciência, acatar esta sentença inválida e desrespeitosa porque contrária aos
requisitos do direito nacional e internacional, como intromissão – e não é a
primeira – nos assuntos internos e na competência da Igreja. Estou disposto a
dar a vida por esta causa.. Se me quiserem prender – conforme o Advogado
querelante há 14 anos preconizava, - estou às ordens. Só assim o mundo saberá
quanto nosso Judiciário é corrupto e arbitrário.
Diante da gravidade do assunto
escreverei nova cartilha para apontar as mazelas do Judiciário e assim
colaborar na sua urgente reforma. Ou o Brasil muda o Judiciário ou o Judiciário
acaba corrompendo o Brasil. Parafraseando S. Gregório VII, posso dizer: “porque
amei a justiça e odiei a corrupção, fui condenado pelo Judiciário brasileiro”.
Deus nos proteja e guarde!
Apelo para o Supremo Tribunal de Jesus
Cristo, o Justo Juiz!
Dom Dadeus Grings
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